Conclusões do último seminário da APDC
Norberto Fernandes, Presidente da APDC, deu as boas vindas aos participantes e frisou desde logo que o objectivo do Seminário era debater o lugar dos cidadãos com necessidades especiais no mercado de trabalho, e a necessidade de uma maior aposta no desenvolvimento e promoção de soluções de software e hardware que eliminem todas as barreiras actuais. A sessão de abertura do seminário ficou ao cargo da comissária do evento, Clara Cidade Lains, que realizou uma apresentação do programa do dia, bem como dos intervenientes deste primeiro painel, nomeadamente, de Maria José Ritta e de Josefina Zambrano da France Telecom.
Na sua intervenção, Josefina Zambrano, afirmou que as pessoas com necessidades especiais (onde se incluem além dos deficientes, os idosos) são consideradas uma minoria de mercado, embora, representem cerca de 10% da população da U.E, devendo portanto ser encarado como um potencial de negócio e não como um mercado de nicho. Neste sentido, aquela responsável chamou a atenção para o facto de existir uma oferta muito diminuta e pouco interessante no mercado a nível de produtos. A maioria dos produtos não está adaptada às necessidades destas pessoas, não suportam as tecnologias emergentes, fora do alcance da maioria das pessoas com dificuldades.
A sessão de abertura contou ainda com a presença de Maria José Ritta, que congratulou a APDC por esta iniciativa, pela escolha da temática bem como pelo ênfase dado às TICs, que considerou um instrumento fundamental no combate à exclusão dos cidadãos com necessidades especiais, já que podem em muito auxiliar e desfazer as barreiras que dificultam a vida das pessoas com deficiências, garantindo um amplo acesso à comunicação. Maria José Ritta destacou a relevância que a Investigação e Desenvolvimento, podem ter quando assumem como objectivo principal o assegurar que os cidadãos não são excluídos. E apesar da insatisfação que possa subsistir, verificaram-se nas últimas décadas avanços significativos, tanto a nível técnico, como cientifico, “a favor das pessoas com deficiência, bem como ao nível do quadro legal, nas estruturas organizacionais e na esfera de valores”. Aquela oradora referiu a importância da sensibilização das comunidades locais e regionais das zonas de residência das pessoas com necessidades especiais de forma a constituírem-se laços e redes entre o tecido empresarial e as populações que o envolvem, uma vez que será dessa interligação que ideias, criações e inovações poderão nascer de forma sustentada e ajustada. Mais do que proporcionar e disponibilizar a tecnologia, há que ouvir o que os deficientes têm a dizer sobre as suas dificuldades para que as aplicações, equipamentos e soluções respondam às suas verdadeiras necessidades, afirmou Maria José Ritta, concluindo pela importância que a Internet poderá ter como meio de criação de locais de encontro e apoio mútuo das comunidades de pessoas com deficiência e daqueles que podem ter algo de importante a acrescentar, fomentando-se a troca de experiências, de ideias e o debate.
No primeiro painel de discussão da manhã, subordinado ao tema “Que Tecnologias: as Novas e Emergentes”, estiverem presentes Wilfredo Ferré, da IBM, Luís Azevedo, da ANDITEC, Joaquim Croca, da Vodafone, e Nuno Beires, da PT Inovação. Na generalidade, estes oradores reconheceram que não existe ainda uma integração efectiva dos deficientes, muito embora estes já não sejam encarados como doentes que precisam de ser reabilitados, mas como cidadãos que devem ser habilitados. Daqui decorre a necessidade de aperfeiçoar as tecnologias de apoio para dotar os aparelhos e aplicações com funcionalidades que respondam às necessidades reais das pessoas. Em destaque estiveram ainda algumas actividades das empresas presentes neste painel, nomeadamente, a nível da disponibilização de novas tecnologias e parcerias, como sucede com as aplicações que permitem gerir ambientes habitacionais e electrodomésticos, onde se inclui o caso do “GRID Liberdade para Comunicar” da ANDITEC, desenvolvido em parceria com a PT Comunicações.
No segundo, e último, painel de apresentações que se verificaram na parte da manhã, e que deu continuidade ao tema anterior “Que Tecnologias: As Novas e Emergentes”, realizaram as suas exposições Rogério Rilhas, do INOV, António Pereira de Oliveira, da Siemens, Carla e Pedro Faria, criadores do Pocket Voice, e Clara Cidade Lains, da PT Comunicações. Este quadro de apresentações deu a oportunidade a cada interveniente de mostrar aquilo que existe em termos de tecnologias, aplicações, serviços e produtos disponíveis. Num país, como Portugal, onde existem 650 mil pessoas com deficiência e mais de 1 milhão de idosos, o que significa que cerca de 20% da população necessita de terminais móveis adaptados às suas necessidades, a terceira geração móvel surge como uma porta aberta para a criação de novas soluções. Uma das conclusões deste painel prende-se com o facto de não ser suficiente disponibilizar a tecnologia no mercado, uma vez que esta auxilia os portadores de deficiência a integrarem-se no mercado de trabalho e no mundo, já que não resolve por si só todos os problemas. Neste contexto, é imperativo desenvolver soluções concretas que respondam ás necessidades das pessoas. Nesta esteira foram apresentados alguns exemplos de sucesso entre os quais se contam as aplicações para o “Pocket Voice”. Carla e Pedro Faria, desenvolveram este projecto para responder às necessidades do seu filho. O “Pocket Voice”, patrocinado primeiro pela Compaq e mais recentemente pela HP, consiste numa ferramenta de comunicação alternativa e aumentativa, que visa substituir os quadros de comunicação tradicionais através associação de símbolos e imagens a sons, correndo em qualquer plataforma normal e assim passível de ser acedido por qualquer um.
A abrir a ordem de trabalhos da parte da tarde esteve Rui Almeida, que moderou o debate sobre “Que Oportunidades e Barreiras”, que contou com a presença de Francisco Godinho, da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, do Secretário Nacional da Reabilitação e Integração de Pessoas com Deficiência, Adalberto Fernandes, de Francesc Aragall em representação do European Institute for Design and Disability, e por fim com a participação de Aurora Farinha do Instituto de Emprego e Formação Profissional de Alcoitão. Francisco Godinho começou por salientar a importância da continuidade do papel desenvolvido pela APDC nesta área, através da realização do terceiro seminário dedicado a este tema. Para este responsável, esta é uma boa forma de envolver os profissionais das Tecnologias de Informação, muito embora esta seja a terceira edição que reúne o mesmo tipo de intervenientes. Segundo afirma, “ainda não evoluímos tanto quanto desejávamos”. Uma das questões mais prementes que este tema levanta prende-se com a questão da acessibilidade do software no local de trabalho. A este propósito aquele responsável afirmou que está já em elaboração um manual, denominado “TI´s sem barreiras no local de trabalho”, que visa preencher a lacuna deixada em aberto pela falta de legislação nesta área. Trata-se de um documento que constitui um alerta para os empresários no que toca às potencialidades e cuidados a ter com os programas específicos para deficientes. Em paralelo a este projecto, estão a desenvolver-se normas de acessibilidade com o Instituto Português da Qualidade. Adalberto Fernandes aproveitou a ocasião para chamar a atenção dos presentes para os direitos dos cidadãos com necessidades especiais. Segundo afirmou, a conquista da democracia significa que todos partilhamos dos mesmos direitos e obrigações, dos quais destacou a importância do direito associativo, a inscrição na escolaridade obrigatória, o direito à formação profissional e a um emprego num mercado de trabalho, pouco preparado para receber cidadãos especiais. Neste âmbito perfilam-se os grandes obstáculos que, na opinião de Adalberto Fernandes, os deficientes enfrentam levando a graves problemas de inserção, por via de uma “surdez e cegueira por parte das empresas”. Já Francesc Aragall, alertou para a necessidade de mudança de atitude já que todos, em alguma altura das nossas vidas, podemos vir a sofrer pelo menos de uma incapacidade. Segundo o presidente do EIDD, perante esta realidade urge preparar as empresas do sector público e privado para a necessidade de ter produtos e disponibilizar serviços acessíveis a todos, sem qualquer tipo de discriminação. A última interveniente deste painel, Aurora Farinha, baseou a sua apresentação na experiência de dez meses que tem no Centro de Reabilitação Profissional de Alcoitão e Ranholas, que conta actualmente com 367 utentes. Segundo esta oradora, a sua missão e a da sua equipa é dar uma resposta eficiente às crescentes dificuldades de uma população de deficientes, cujos problemas mudaram radicalmente na última década. De acordo com aquela responsável, o objectivo neste momento é aumentar a oferta de serviços, melhorar a qualidade dos mesmos, beneficiar o maior número de utentes e introduzir exigentes padrões de rigor, promovendo em simultâneo uma estratégia de parcerias de qualificação para o emprego com as empresas, as associações, as instituições particulares, com a Associação Nacional de Bombeiros, as autarquias locais e as escolas.
A APDC estruturou este Seminário de modo a incluir um painel de apresentação de casos de sucesso nesta matéria. O primeiro caso a ser apresentado no seminário foi o da Silvex, uma empresa que emprega actualmente 11 funcionários deficientes efectivos, num universo de 130/140 trabalhadores. Para Paulo Azevedo, administrador da empresa, o simples facto da sua empresa estar a ser apresentada como um caso de sucesso significa que ainda há muito por fazer em empresas de outras dimensões, “é tão natural empregar deficientes, que o mercado de trabalho deveria ser mais fluido nesta matéria, até porque as novas tecnologias assumem um papel premente na optimização dos serviços prestados pelos deficientes,” explicou. De seguida, ouviram-se outros casos de sucesso, nomeadamente, de Pedro Oliveira, um deficiente com uma incapacidade na ordem dos 80%, licenciado em Ciência Política e Relações Internacionais e bolseiro no INETI, que afirma que a sua utilização das TI não difere muito do utilizador comum, e de Diogo Grilo da Associação Portuguesa de Surdos que chamou a atenção para a necessidade de reduzir os custos das comunicações móveis, entre elas das mensagens SMS, para os surdos e de normalizar o uso da teleconferência. Nuno Quaresma da AFID trouxe consigo Ricardo Galante, um deficiente aluno e utente da desta instituição que desenvolve actividades como ilustrador e fotógrafo da revista Diferença, entre outras, reforçando a ideia de que os cidadãos com necessidades especiais têm que deixar de ser vistos como artistas marginais. O último interveniente deste painel foi o atleta internacional, e por diversas vezes medalhado, Paulo Coelho, que é licenciado em economia e desenvolve a sua actividade profissional como técnico revisor de braille no Instituto de Solidariedade e Segurança Social.
No que respeita à questão da “Cidadania – Uma Responsabilidade de Todos”, Guida Faria, da Liga Portugueses de Deficientes Motores, referiu que é importante proporcionar aos deficientes o mesmo tipo de acesso à informação e ao conhecimento que se dá a qualquer outro cidadão, valorizando desta forma a sua dignidade. Outra ideia central do discurso desta oradora foi o facto de que, hoje, já se encontrarem parceiros válidos dispostos a participar na luta pela integração dos deficientes. Por seu lado, o administrador da Portugal Telecom, Pedro Leitão, afirmou que este “mercado tem que ser encarado como uma oportunidade de negócio”. Trata-se de clientes acima de tudo, que necessitam de um portfólio de produtos como qualquer outro segmento e que se não tiver à sua disposição as soluções necessárias não pode ser explorado do ponto de vista empresarial. A PT disponibiliza, neste momento, uma série de soluções que respondem a vários tipos de dificuldades, nomeadamente, o PT Voz Activa, o serviço informativo 118 Braille, o PT Conversas, e o PT Emergência. A propósito desta temática, Jorge Fernandes em representação de Diogo Vasconcelos da UMIC, destacou o Plano Nacional para a Participação dos Cidadãos com Necessidades Especiais, parte integrante de um pacote de acções mais vasto denominado “Plano de Acção para a Sociedade de Informação”. O Plano Nacional visa promover a acessibilidade digital à informação, tendo este responsável salientado que 60% da informação impressa actualmente nas empresas está originalmente em formato digital. “Para cidadãos especiais isto é extremamente importante porque podemos trabalhar com a informação na origem”. Desta forma, o governo tem previsto um conjunto de iniciativas a médio e curto prazo que incluem, entre outras, a criação de uma rede de acesso à Internet para associações de pessoas com deficiência, e o lançamento de um programa de financiamento para as áreas da inovação, reabilitação e acessibilidade.