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O conforto, tal como a segurança, custa-nos a privacidade

Na Era do consumo exacerbado, o dinheiro deixou de ser a única moeda de troca válida na aquisição de produtos ou serviços

*Opinião

A mais recente novidade da Amazon, chamada simplesmente de Echo, causou algum furor nos últimos dias. As diferentes perspectivas sobre a mesma também.

A Amazon Echo é uma assistente pessoal – isto significa que as comparações com outras assistentes, que incluem a Siri, a Cortana ou o Google Now, serão algo inevitáveis. Mas a Echo tem um twist – é uma assistente física, o que significa que está mesmo lá para nos ouvir. E “ouvir”, de facto, parece ser a grande palavra-chave por detrás da Echo, e também aquela que mais águas tem vindo a dividir na imprensa especializada em tecnologias.

A diferença da Echo face às suas contemporâneas digitais assenta sobretudo na presença física que as outras não podem oferecer. Não iremos alongar-nos em grandes detalhes sobre a mesma – para isso podem consultar as informações aqui -, mas iremos referir que a Echo vem equipada com uma panóplia de microfones que lhe permitem, essencialmente, escutar tudo à sua volta. E é aqui que começa a confusão.

 

 

A Amazon argumenta que esta monitorização – uma palavra que não está no vocabulário da empresa, mas que se pode empregar neste contexto – tem o propósito simples de facilitar a vida ao utilizador. E está totalmente correcta. De facto, sabendo tudo sobre os seus clientes, a empresa consegue tornar o seu serviço bem mais eficiente. Isto não é inédito. Esta é a estratégia que a Google tem vindo a aplicar, com maior ou menor profundidade, aos utilizadores dos seus produtos e serviços. E também o Facebook, entre várias outras gigantes tecnológicas.

Através destas características, todos estes serviços e produtos são capazes de aprender mais sobre os seus utilizadores para garantirem a personalização da experiência. E para conhecer um utilizador, em termos puramente digitais, são necessários dados – que podem ser submetidos voluntariamente pelo próprio utilizador, ou que podem ser recolhidos de outras formas (com ou sem o consentimento do utilizador). Esta recolha e processamento de informações será cada vez mais comum.

Além dos dispositivos móveis, outras categorias de dispositivos – televisões e automóveis são apenas dois exemplos – também vão adoptar esta tendência. Tudo isto irá trazer uma comodidade que, há apenas 10 anos atrás, seria impensável. Em troca, como é esperado, devemos apenas submeter a nossa privacidade. Não há garantias de que a NSA irá realmente preocupar-se connosco ao ponto de nos seguir atentamente, mas também não existirão obstáculos caso a agência de segurança nacional norte-americana (entre outros potenciais parceiros governamentais) opte por fazê-.lo.

Mais preocupante, contudo, é o lucro extra que estaremos a fornecer às multinacionais que nos fornecem serviços e que lucram com os dados que lhes submetemos. A única coisa que poderemos exigir em troca pelos serviços prestados é um maior conforto e uma melhor experiência de utilização.

Tudo isto poderia levar a crer que um dia, num futuro talvez não tão distante quanto isso, o ser humano deixará de ter necessidade de fazer o que quer que seja – em troca, além da monitorização quase-permanente, quase tudo passará a ser feito por ele, no maior conforto possível, com o mínimo de acção necessária.

E claro, no lugar de cidadãos teremos antes consumidores.